A norma
jurídica é a célula do ordenamento jurídico (corpo sistematizado de
regras de conduta, caracterizadas pela coercitividade e imperatividade). É um
imperativo de conduta, que coage os sujeitos a se comportarem da forma por ela
esperada e desejada.
A compreensão da
norma jurídica somente é possível a partir da noção de ordenamento jurídico
isto porque a eficácia da norma e a institucionalização da sanção dependem da pré-existência de um
ordenamento jurídico.
Não existe nenhuma
norma juridicamente válida sem a existência de um ordenamento jurídico
correspondente, apesar de ser possível a discussão acerca da possibilidade da
norma jurídica ser ou não ser justa ou eficaz independente da sua validade.
A norma jurídica é
uma construção da linguagem, especificamente um comando genérico e universal.
A norma jurídica é
um comando e, portanto, possui um caráter impositivo e despsicologizado,
dirigido essencialmente a conduta humana ou sobre as próprias normas jurídicas.
Norma jurídica é
sinônimo de regra jurídica, apesar de alguns autores reservarem a denominação
regra para o setor da técnica e, outros, para o mundo natural. Há distinção
apenas entre norma jurídica e lei. Está é apenas uma das formas de expressão
das normas, que se manifestam também pelo Direito costumeiro e, em alguns
países, pela jurisprudência.
As normas jurídicas
são contrárias aos fatos reais, exprimem um dever ser que resulta em uma
conseqüência jurídica – que pode ser ou não uma sanção. É dizer, as normas
jurídicas são contrafáticas porque possuem validade independente da lógica ou
do senso comum.
O carácter
contrafático da norma jurídica indica que a norma jurídica é sempre instrumento
para a transformação social (função progressista) ou para a manutenção de
princípios (função conservadora).
Obs.: Norma dispositiva, também chamada de
Facultativa, é aquela que se limita a declarar direitos, autorizar condutas, ou atuar em caso
duvidoso, ou omisso.
Características dominantes das normas jurídicas e aplicabilidade
·
Quanto ao
destinatário.
O destinatário
geral da norma jurídica é o homem, todavia é possível que a norma jurídica
pode-se dirigir também a outras normas jurídicas. É possível destacar, a partir
deste critério, o alcance da norma jurídica. Assim, as normas jurídicas podem
abranger grupos muito amplos ou determinados indivíduos ou situações
especificas.
·
Quanto ao modo de
enunciação.
As normas jurídicas
podem ser escritas, orais ou mesma expressas de modo não verbal (p. ex.,
semáforo).
·
Quanto à finalidade.
A norma jurídica
pode ser proibitiva, permissiva (porque proíbe outros) ou preceptiva, tendo em
vista a descrição de uma conduta ou um comportamento. Todavia, a norma jurídica
também pode dirigir-se apenas a diretrizes, intenções e objetivos. É o caso das normas
jurídicas programáticas.
·
Quanto ao espaço.
As normas jurídicas
podem incidir em variados espaços e respeitar determinados limites espaciais de
incidência. As normas jurídicas podem ser internacionais, nacionais ou mesmo
respeitar os limites dos Estados da Federação ou dos Municípios.
·
Quanto ao tempo.
As normas podem
variar conforme o momento de vigência. As normas jurídicas podem ser validas
permanentemente, provisoriamente ou temporariamente. A permanência diz respeito
ao tempo de cessação da vigência e não ao tempo de início. Isto é, uma norma é
permanente mesmo que o prazo inicial seja posposto à promulgação – vacatio
legis. Nesse último caso, a norma jurídica pode possuir incidência imediata
e incidência mediata.
·
Quanto às consequências.
As normas jurídicas
podem ser dividas em normas de conduta e normas de sanção tendo em vista suas
conseqüências. As normas de conduta, pelo critério de finalidade, podem
exprimir uma obrigação, proibição ou permissão. As normas de sanção indicam
conseqüências do descumprimento da norma de conduta.
·
Quanto à estrutura.
As normas jurídicas
podem ser normas autónomas e normas dependentes. As normas jurídicas autónomas
são as que tem por si um sentido completo, isto é esgotam a disciplina que
estatuem. É o caso de uma norma que revoga a outra. As normas jurídicas
dependentes exigem combinação com outras normas jurídicas, em relação a
estrutura. São dependentes porque estatui o comportamento e por isso se liga a
outra, que lhe confere sanção.
·
Quanto à subordinação.
As normas jurídicas
podem ser normas-origem e normas-derivadas. Normas-origem são as primeiras de
uma série. As demais normas da série, que remontam à norma-origem, são
derivadas e mestrada de kelven jose
Elementos
do conceito da norma jurídica
Toda norma jurídica
compõem-se num suporte fático e numa correlata conseqüência jurídica
realcando-se os elementos:
·
a imperatividade, pois que o seu
comportamento é obrigatório, ficando os destinatários sujeitos a sanções se as
não cumprirem;
·
a generalidade, já que se destinam a ser
aplicadas a toda uma categoria de destinatários, não determinados concreta e
individualmente (ainda que, por exemplo, refiram-se ao Presidente da República,
pois neste caso dirigem-se à instituição e náo à pessoa que assume essas funções);
·
a abstração, pois fixam a conduta a
adoptar em situações de fato abstratas; "haverá lugar a ..." ou
"designar-se-á ...";
·
a hipoteticidade, uma vez que estabelecem
condutas a adoptar no futuro, se se verificarem os fatos que hipotéticamente se
prevêm, ou seja, "sempre que" ou "quando"1 ,
no modelo: “Se
A, então B.
A sanção não pertence aos elementos definidores da norma jurídica (suporte fáctico ou conseqüência jurídica), trata-se de decorrência da necessidade do comando prescritivo do direito - isto porque a força legal é o instrumento de realização do direito (entendido amplamente como ordenamento jurídico).
A norma jurídica é
aquela norma cuja execução será garantida por uma sanção externa e
institucionalizada.
Estruturalmente: Se
A + B + C, então Cj:, onde A, B e C são os elementos de fato, A + B + C é o
suporte fáctico (conjunto dos elementos de fato) e, Cj, a consequência
jurídica.
Graficamente:
Aparecimento do fenómeno jurídico demonstrado através do Diagrama da Norma
Jurídica.
·
Fs = Facto social: Tudo que o homem faz e exterioriza.
Tudo que ocorre na sociedade.
·
Va = Valor agregado: É o valor que agregamos às
coisas. A importância das coisas para a sociedade, ou de pessoa para pessoa.
·
Nj - Norma jurídica: São condutas estabelecidas para
todos.
·
D = Direito
·
: Orienta condutas. Fruto da convivência humana.
·
P = Prestação: A aceitação da norma. O apoio.
·
Ñp = Não prestação: A não aceitação da norma. Transgender.
·
C = Coerção: É o uso da força pelo direito.
·
S = Sanção: É a punição. Se você não cumpre a conduta,
você é sancionado.
Chega-se assim,
ao conceito fundamental da norma jurídica, que é uma regra de
cumprimento obrigatório e de conteúdo simultaneamente abstracto, geral e
hipotético2 .
- 1.º - Remissão para o que já foi leccionado anteriormente.
- As normas jurídicas, como normas de conduta social que são, prevêem as situações que visam regular e fixam as condutas que querem que se observem.
- Noção de Oliveira Ascensão: “critério de qualificação e decisão de casos concretos”.
4Estrutura da
norma jurídica.
- Chama-se justamente previsão à primeira fase (representação
da situação da
vida social e regular) e estatuição à segunda
(estabelecimento
da conduta a observar).
- A previsão faz-se de forma geral e abstracta (com vista a contemplar todas as realidades futuras), mas pode haver normas em que a previsão é um acontecimento singular e concreto: “Quando vagar o lugar de escrivão no tribunal de…será extinto esse lugar”.
- A estatuição é sempre geral e abstracta.
- Na norma “Quem encontrar coisa perdida e souber a quem pertence, deve restitui-la ao seu dono”, a primeira parte constitui a previsão (quem encontrar e souber) e a segunda a estatuição (deve restitui-la).
- A ordem pode ser diferente: “o professor marcará falta (estatuição) aos alunos ausentes” (previsão). 5Aplicação prática
- Ex: art. 483.º CC – Aquele que, com dolo ou mera culpa,
violar
ilicitamente o direito de outrem ou qualquer
disposição legal
destinada a proteger interesses alheios//
fica obrigado a
indemnizar o lesado pelos danos
resultantes da
violação.
- Que estrutura segue a norma?
- Norma jurídica = previsão (ou hipótese legal) + estatuição
- Previsão: antecedente; descrição de determinados factos, comportamentos, estados, acontecimentos. Descrição da factualidade que vai ter relevância para o direito (situações típicas da vida).
- Estatuição: consequente. É a consequência jurídica, o que de facto vai despoletar no mundo do direito. São os direitos e deveres (efeitos jurídicos) que surgem por força do preenchimento da previsão.
- Artigo 502.º CC: Quem no seu próprio interesse utilizar quaisquer animais//responde pelos danos que eles causarem, desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua utilização.
- Artigo 1340.º CC: Se alguém de boa fé construir obra em terreno alheio, ou nele fizer sementeira ou plantação, e o valor que as obras, sementeiras ou plantações tiverem
trazido à
totalidade do prédio for maior do que o valor que este tinha antes// o autor da
incorporação adquire a propriedade dele, pagando o valor que o prédio tinha
antes
das obras,
sementeiras ou plantações.
- Nota adicional: Como sinónimos de norma usam-se regra, comando, preceito, disposição, lei.
- “Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar ou auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.”
- Previsão - “Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa…
- Estatização – deixar de lhe prestar ou auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro.
- Sanção - é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.
- Imperatividade: as normas impõem comandos, regras, ordens de conduta. Podem ser positivas (“o inquilino tem de pagar a renda”) ou negativas (“ não matarás”), ou apenas declarativas. Por isso é que as normas jurídicas são tão diferentes das leis científicas,que se limitam a a realidade e a descrevê-la como ela é. O Direito não: é o
“Dever-ser”, não
o “ser”.
- Generalidade e abstracção: as normas jurídicas são sempre genéricas (aplicam-se a uma generalidade de pessoas), aplicam-se a todos que praticarem determinada acção ou omissão, ou que estiverem em certa situação. Abstracta porque também não é concebida para casos concretos, mas para um conjunto abstracto de potenciais situações.
Características dominantes das normas jurídicas (revisão)
- Coercibilidade: no fundo, todas estas características também se aplicam às normas de cortesia, religiosas e morais. Também impõem comandos e também se destinam a um conjunto indeterminado de pessoas e situações. O que realmente diferencia as normas jurídicas das outras é a sua coercibilidade. Quem não cumprir o comando imposto pelo Direito sofrerá sanções.
E a ordem
jurídica apressa-se a repor a situação que deveria existir se não tivesse
havido violação, nomeadamente através da força pública, recurso a tribunais,
etc. Se o inquilino não pagar o preço, pode obter-se uma decisão judicial que o
force a pagar, executando-se o seu património. Se alguém furtar um relógio,
será obrigado a devolve-lo, ou pelo menos o valor equivalente. Se alguém matar
uma pessoa será sancionado,
por exemplo, com
pena de prisão. Se alguém violar uma regra
de trânsito, paga
uma coima…
Ou seja, pode
usar-se a força para impedir ou reprimir a 10 violação das normas jurídicas.
Classificações das normas jurídicas – perceptivas, proibitivas e permissivas
A ordem jurídica
ordena ou proíbe através de imposições;
Normas
preceptivas: v.g. as normas que nos obrigam a pagar impostos ou a circular pela
direita;
Normas
proibitivas: v.g. as normas que punem o homicídio, as ofensas corporais, o
furto ou o roubo;
Normas
permissivas ou concessivas: a ordem jurídica também autoriza certas condutas,
concedendo aos sujeitos certos poderes (direitos, permissões); exemplo de
permissão pura: 1450º CC; exemplo de concessão de autonomia à vontade dos
interessados para produzirem efeitos jurídicos (cfr. art.s 405º, 1698º CC, 339º
e 337º CC, 32º CP).
Normas
permissivas-justificativas: quando permitem em certas condições praticar actos
que, se não fosse a permissão contida nessas normas, seriam proibidos, ilícitos
(337º ou 339º CC: legítima defesa e direito de necessidade) 11Classificação das
normas jurídicas – universais, regionais e locais.
Universais: as
que se aplicam em todo o território do Estado (v.g.: CRP, CP, CC, maioria das
Leis e D.L.’s);
Regionais:
aquelas que apenas se aplicam numa região autónoma (Decretos das Regiões
Autónomas dos Açores e da
Madeira);
Locais: as que
apenas se aplicam no território de uma
autarquia local
(posturas e regulamentos locais); 12Classificação das normas jurídicas gerais
(ou Direito-regra) e excepcionais
Normas gerais:
regime-regra para o sector da vida que regulam (v.g. art. 219º CC:
“consensualidade”);
Normas
excepcionais: recortam uma parte daquele sector e estabelecem para essa parte
restrita, por razões privativas dele, um “regime oposto àquele regime-regra”
(v.g. 1143º CC: escritura pública);
N.B.: a
distinção é muito importante porque o art. 11º CC dispõe que as normas
excepcionais não comportam aplicação analógica;13Classificação das normas
jurídicas direito comum e de Direito especial; gerais e especiais.
A) Existe um
regime especial para um facto ou situação que se
não fosse objecto
da norma especial (v.g. art. 131º CP),
caberia
inteiramente na norma geral (v.g. art. 132º CP:
“especial
censurabilidade”);
B) Há um
regime-regra, comum para todo o sector de relações ou situações jurídicas (v.g.
CC ou CP) e depois a lei recorta um subconjunto ou subsector de relações ou
situações dentro daquele conjunto e estabelece para o subconjunto uma
disciplina
especial (v.g. Código do Trabalho ou Código de Justiça Militar);
Classificação das normas jurídicas leges ( Sanções)
Nota: Atende-se agora às sanções aplicáveis pela violação da
norma
Leges plus quam
perfectae: são as normas cuja violação importa ao mesmo tempo a nulidade do
acto e ainda outra sanção: v.g. contrato de usura (art. 282º CC) em que à
nulidade do
negócio acresce a redução dos juros para a taxa
legal (art.
1146º/3 e 4);
Leges perfectae:
são normas cuja violação importa como sanção apenas a nulidade do acto, como
v.g.: o contrato de mútuo celebrado por documento particular quando a lei exige
escritura pública (o compromisso de, v.g., um cônjuge “confessar” perante o
outro a violação dos seus deveres conjugais, é nulo, por contrário aos bons
costumes, mas não é punível; em Direito penal o “direito ao silêncio” é um
direito fundamental;
Leges minus quam perfectae: normas cuja violação
importa
Leges
imperfectae: são normas cuja violação não acarreta qualquer sanção, como v.g.
no Código da Estrada de 1994, a passagem dos peões fora das passadeiras, era
proibida, mas a violação da norma não implicava qualquer sanção;
Classificação das normas jurídicas
– autónomas e
não-autónomas ou completas e incompletas
- Autónoma ou completa: aquela que, por si só, tem um sentido completo, produz efeitos só por si, contém em si a regulamentação completa de uma situação jurídica (v.g. 131º CP);
- Não-autónoma ou incompleta: não produz efeitos só por si (v.g. 994º CC: “é nula a cláusula…”; 23º/2 CP: tentativa; 25º e ss. CC: norma de conflitos)17Classificação das normas jurídicas – imperativas; dispositivas; supletivas, interpretativas
- Normas imperativas, cogentes ou injuntivas: quando a conduta que estatuem é obrigatória, verificada a sua previsão (v.g. art. 1874º ou art. 1877º CC), podendo ser preceptivas ou proibitivas, conforme vimos;
- Normas dispositivas: podem ser facultativas ou permissivas (já estivemos a ver), interpretativas e supletivas;
- “Normas interpretativas”: são as normas cuja função é determinar o alcance e sentido de certas expressões ou de determinadas condutas declarativas ou actos das partes, em caso de dúvida; entre elas.
- “Normas supletivas”: são as normas que se destinam a suprir a falta de manifestação da vontade das partes sobre determinados pontos do negócio que carecem de regulamentação .
Caso a consequência de uma norma
jurídica não seja respeitada, surge uma nova norma,chamada sanção. Será
que a sanção é parte integrante da norma jurídica, ou será que existem normas
jurídicas sem sanção?
Tal debate revela posicionamentos
quanto à natureza do próprio direito. Um jurista como Kelsen, por exemplo, não
admite que existam normas jurídicas desprovidas de sanção. Ao contrário, afirma
que a sanção é o elemento fundamental da norma jurídica, que estabelece
punições a comportamentos que não ocorrem. Algumas normas, porém, são
interpretativas, apenas determinando o sentido de outras. Elas, por não
apresentarem sanções, deixam de ser jurídicas?
Kelsen afirma que continuam a ser jurídicas, mas são consideradas normas
dependentes, pois
referem-se a outras, que possuem sanção. Daí surge novo problema: e as normas
de competência, que delimitam a competência de funcionários públicos, por
exemplo, são jurídicas? Tais normas não possuem sanção e não se referem a
outras.
Também aqui cabe uma objeção: haveria uma sanção implícita nas normas de
competência. Trata-se da pena de nulidade. Se um funcionário público age sem
ter competência para fazer algo, seu comportamento será considerado nulo.
Outros pensadores, todavia, alegam que a nulidade não é uma sanção, pois não
pune o autor do ato, mas apenas desfaz o acto.
Daí surgir outra reflexão: será que todas as normas jurídicas pretendem desencorajar comportamentos, punindo
aqueles que os pratiquem? As normas jurídicas não podem, ao contrário,
estimular determinadas condutas, que podem ou não ser realizadas, mas, caso
realizadas, geram benefícios a seus agentes?
Aqui entra a perspectiva, muito
difundida no presente, de que a sanção não é, necessariamente, uma punição.
Pode haver a sanção punitiva, mas também há bastantes normas que estipulam
sanções premiais, atribuindo um benefício caso a consequência da norma jurídica
se concretize. Tal perspectiva alarga o conceito de sanção e não considera o
direito apenas um instrumento de ameaças, mas também um agente que promove a
transformação social.
Ora, isso leva a mais uma reflexão: considerar
a sanção, sobretudo em seu sentido penal, elemento essencial da norma jurídica
revela uma concepção do direito enquanto fenômeno coativo. Não haveria
direito se a violência estatal não fosse exercida. Cada norma jurídica, assim,
preveria uma violência específica. Porém, o direito pode ser visto não como
violência concreta (coação), mas como sua ameaça (coerção). O essencial do
direito não seria a punição aplicada, mas a possibilidade de, eventualmente,
fazê-lo. Mais importante do que existir uma sanção para cada norma jurídica
seria a existência de autoridade no cometimento da relação comunicativa que
cria tais normas.
Independentemente da posição, o debate
é acalorado. Podemos considerar todos os argumentos válidos, mas parece mais
plausível considerar o direito um fenômeno coercível, cuja ameaça de sanção
aparece em muitas normas, mas não necessariamente em todas.
Outra discussão que envolve a norma
jurídica diz respeito a algumas de suas características: será que toda norma jurídica
deve ser bilateral, geral e abstrata?
Enquanto norma ética, não resta dúvidas
de que a norma jurídica ésocialmente bilateral. Só podemos falar
de normas éticas em situações sociais, que envolvem mais de uma pessoa, nunca
em situações unilaterais. Mesmo normas jurídicas que qualificam uma pessoa, por
exemplo, dizendo que se trata de alguém capaz, somente faz sentido se colocada
em um contexto no qual essa pessoa irá se relacionar com outras.
Por outro lado, a norma jurídica também
é axiologicamente bilateral. Os valores impostos pelas normas jurídicas às
relações sociais não trazem o bempara apenas um
dos sujeitos, mas perseguem, sempre, o bem de ambos e, acima disso, o bem
comum. Ainda que uma norma imponha deveres a uma das partes e dê
poderes à outra, fará isso porque é o melhor não para a pessoa que recebeu os
poderes, mas para a sociedade toda.
Já a generalidade da norma jurídica é
questionável. Uma norma jurídica será geral caso refira-se a uma quantidade
indeterminada de destinatários. As leis são exemplos de normas jurídicas
rotineiramente gerais, pois costumam referir-se a todas as pessoas. Porém, há
outras normas jurídicas que se referem, em regra, a pessoas determinadas,
sendo, portanto, individuais. É o caso das sentenças, normas jurídicas que se
referem às partes do processo, ou dos contratos, normas jurídicas que se
referem aos contratantes.
Quanto à abstração, também não parece
ser um requisito da norma jurídica. As normas jurídicas abstratas, novamente
como costumam ser as leis, referem-se a fenômenos sociais em sua
universalidade. As normas de direito do consumidor, por exemplo, referem-se a
todas as relações entre consumidores e fornecedores. Outras normas jurídicas,
como as sentenças e os contratos, referem-se, usualmente, a fenômenos sociais
concretos, como uma relação social específica ou um conflito específico.
Se devemos considerar, portanto, que as
normas jurídicas são bilaterais, quer social, quer axiologicamente, não podemos
afirmar que sejam apenas gerais e apenas abstratas. Vimos que podem ser
individuais e concretas.
Miguel Reale afirma que existem dois
tipos básicos de normas jurídicas, cada uma estruturada de modo próprio: normas
de organização e normas de conduta.
A norma de organização é aquela que, como o nome indica,
organiza: 1. O Estado, estruturando e regulando o funcionamento de seus
órgãos; 2. Os poderes sociais, fixando e distribuindo capacidades e competências;
3. O direito, disciplinando a identificação, a modificação e a aplicação das
normas jurídicas.
Sua estrutura lógica revela a
existência de um juízo categórico,
ou seja, a norma constata que algo existe e estabelece uma consequência que
deve ser respeitada. Pode ser representada pela fórmula: A dever ser B. Note
que o fato A não é hipotético, mas concreto.
Um exemplo de norma de organização é o
artigo 2º da Constituição Federal. Constatada a existência de Poderes da União,
afirma-se que devem ser independentes e harmônicos entre si.
A norma de conduta,
por seu turno, disciplina o comportamento dos indivíduos e dos grupos sociais.
Sua estrutura lógica revela um juízo hipotético,
prevendo uma situação que pode ocorrer ou não e estabelecendo uma consequência
que deve suceder à primeira situação. Pode ser representada pela fórmula: Se A,
deve ser B.
Um exemplo de norma de conduta é o
artigo 73 do Código Civil. Seu texto prevê que, se uma pessoa não possuir
residência habitual (hipótese normativa), deve ser considerado seu domicílio o
lugar em que for encontrada (consequência jurídica).
As normas de conduta apresentam,
rotineiramente, dois componentes normativos em sua estrutura: a endonorma e a
perinorma. Cada um desses componentes pode ser considerado, isoladamente, uma
norma jurídica, prevendo uma hipótese e uma consequência.
A endonorma prevê, como hipótese normativa, um facto
ou ato da vida social, e atribui a ele uma consequência que deve ser
respeitada. Assim, caso o ato previsto ocorra, surge um novo comportamento como
permitido, proibido ou obrigatório. Podemos representá-la com a fórmula já
utilizada: Se A, deve ser B (sendo A a hipótese e B a consequência)
A perinorma é o componente da norma que reforça a
consequência da endonorma. Ela pode reforçar essa consequência por meio de uma
punição, que será chamada de sanção penal ou negativa, ou de um prémio, que
será chamado de sanção premial ou positiva.
Caso a perinorma estabeleça uma sanção
penal, sua hipótese corresponde à conduta oposta daquela prevista na
consequência da endonorma e sua consequência, que deve ser aplicada, é uma
punição. Pode ser representada assim: Se não B, deve ser SPe.
Caso a perinorma estabeleça uma sanção
premial, sua hipótese corresponde à conduta similar à prevista na consequência
da endonorma e sua consequência, que deve ser aplicada, é um benefício. Pode
ser representada assim: Se B, deve ser SPr.
As normas jurídicas, assim, sobretudo
aquelas de conduta, correspondem à soma da endonorma e da perinorma. Podem
existir normas que trazem uma perinorma negativa e uma perinorma positiva, ao
mesmo tempo.
Conclusão
Independentemente da posição, o debate
é acalorado. Podemos considerar todos os argumentos válidos, mas parece mais
plausível considerar o direito um fenômeno coercível, cuja ameaça de sanção
aparece em muitas normas, mas não necessariamente em todas.
Aqui entra a perspectiva, muito
difundida no presente, de que a sanção não é, necessariamente, uma punição.
Pode haver a sanção punitiva, mas também há bastantes normas que estipulam
sanções premiais, atribuindo um benefício caso a consequência da norma jurídica
se concretize. Tal perspectiva alarga o conceito de sanção e não considera o
direito apenas um instrumento de ameaças, mas também um agente que promove a
transformação social.
Kelsen afirma que continuam a
ser jurídicas, mas são consideradas normas dependentes,
pois referem-se a outras, que possuem sanção. Daí surge novo problema: e as
normas de competência, que delimitam a competência de funcionários públicos,
por exemplo, são jurídicas? Tais normas não possuem sanção e não se referem a
outras.
Também aqui cabe uma objecção: haveria uma sanção implícita nas normas
de competência. Trata-se da pena de nulidade. Se um funcionário público age sem
ter competência para fazer algo, seu comportamento será considerado nulo.
Outros pensadores, todavia, alegam que a nulidade não é uma sanção, pois não
pune o autor do ato, mas apenas desfaz o acto.
Quanto à sua
violação (sanção) Normas Mais que Perfeitas – são
normas cujo cumprimento está cercado de dupla garantia. A violação determinada
à nulidade do ato e a aplicação de uma restrição ou pena ao infractor. Ex.
proibição de casamento de pessoas já casadas, enquadramento: bigamia.
Normas Perfeitas – são normas em que o direito se
contenta com o restabelecimento da ordem jurídica, ou seja, restabelece a
situação anterior não impõe sanção. Ex. a compra e venda que um menor faz e a
loja aceita.
Normas Menos que Perfeitas – são aquelas
que se limita a aplicar uma pena ou
consequência restritiva, mas não
privam o acto de sua eficácia.
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